quinta-feira, novembro 23

Diário na Varanda... desta vez sobre o tempo e a memória...

Aos 17 anos comecei a trabalhar, e, recordo-me com felicidade que foi aí também que penso ter começado a aprender a estudar. Também me lembro que sempre me queixei de minha memória, sempre deixando falhas nas minhas relações pessoais, nas minhas relações profissionais e especialmente no exercício da minha profissão. Na hora “H”, aquele branco... Faltava o nome do rio, o nome do autor, o nome do presidente, o número que expressava uma realidade, enfim: incomodava tanto, que comecei verdadeira empreitada de superação desta dificuldade.
Ninguém podia citar perto de mim uma técnica mneumônica que eu tchum... ligava as antenas, e sozinha colocava aquilo em exercício. Curso de neurolinguísta e outros, não podia saber que alguém tinha feito que eu colava, apanhava o material emprestado, lia, aplicava, e resultado mesmo que eu queria? NADA. Apelei para remédios, vitaminas, vitaminas enriquecidas com minerais, alimentos enriquecidos, agentes contra radicais livres, e??? NADA.

O incômodo de ter que conviver com tal deficiência só aumentava. Os filhos nasceram, e quanto maior a sensação de escoamento rápido do tempo, o esquecimento crescia talvez na mesma proporção. Não me recordo se apelei para mandingas, rezas fortes, o que é bem provável! Mas perdi a conta de panelas que queimei, de receitas que desperdicei, de provas que não corrigi no prazo combinado, e até certa vez esqueci que idade eu tinha, quando abordada por uma secretária, informação que precisei recorrer ao meu RG para calcular. Datas de aniversário de pessoas importantes, nossa!!!???? E a ortografia correta da palavra que tinha que ir para o quadro??? Insuportável.
Não me esqueço da vez que saí descontente de um consultório médico em que fiquei um tanto aborrecida com o mesmo. Desta vez ele ousou a não receitar nada, nem vitaminas, nem técnicas de memorização, nada. A consulta encerrou, depois de várias perguntas, com:
- Você se lembra de quanto tem na sua conta bancária?
Eu respondi:
- Sim, lembro-me!
Então o que você tem não é nada demais, inclusive pelo que você me conta, o esquecimento te é necessário. É memória seletiva. Fiquei chateada, mas no fundo achei aquilo com tom de sensatez.
Inconformada, fiquei, até conhecer a “história” de Funes, e desde então invoco todos os dias ao cosmo a graça do esquecimento...

Márcia

Imagem disponível em:http://www.nemersonlavoura.blogspot.com/

2 comentários:

Paulo Sérgio Ribeiro disse...

Obrigado pelo carinho. Vou pensar sim nisso.

Varanda do Degredo disse...

Tô adorando o show que você tem dado!!! Acho que vou continuar daqui com um binóculo assistindo às luzes, ao "som" das palavras, ao cheiro das idéias, às cores vivas da varanda...
Lamento contudo concluir que, apesar de tudo que tenho passado, tenho considerado minha memória "de ouro"!!! Lamento, porque assim confesso minha falta de sabedoria... A solução está - descubro à essa hora da madrugada - em invocar a tal "graça do esquecimento"!!?! Brilhante!!! Tudo invertido, diferentes prismas... Fico devendo mais essa à varanda! E adoto! Perfeito! Convenceu-me... Obrigada, Marcelle.